RELIGIÃO

O Reveillon de Copacabana e a apropriação cultural

Durante o ano todo, as religiões pentecostais oprimem e execram os praticantes de religiões de matriz africana para, no dia 31 de dezembro, vestirem branco, pularem ondas, beberem champagne e jogarem flores no mar.

Atualmente, uma das festas de virada do ano mais famosas do mundo é a realizada na praia de Copacabana, no Rio de Janeiro. Ao longo dos 4 quilômetros de praia que vão do forte do Leme ao forte de Copacabana, devem se aglomerar cerca de dois milhões de pessoas, provenientes de quase todos os países do mundo.

Acontece que poucos sabem das origens dessa tradição. Ainda na década de 60, praticantes das religiões de matriz africana começaram a se dirigir às praias, especialmente à praia vermelha, em Botafogo e à praia de Copacabana, para reverenciar Yemanjá, a deusa yorubana dos mares, com toquese os tradicionais presentes.

A primeira vez que passei um ano novo na praia, foi de 1981 para 1982, em Cabo Frio. Não me lembro exatamente dos dias que passamos lá, mas com certeza passamos o Natal e o Ano Novo. Eu tinha 16 anos e fiquei encantado com os ritos. A cidade ainda era pacata e tranqüila, poucas pessoas se dirigiam à Região dos Lagos. Foi muito bom. Eu ainda tinha uma ilusão de família feliz.

Voltando ao assunto principal: os praticantes de Umbanda e Candomblé se dirigiam às praias, especialmente à de Copacabana, faziam seus ritos, soltavam uns fogos e retornavam. Aos poucos, a burguesia curiosa passou a descer de seus apartamentos litorâneos para acompanhar os festejos.

O começo da apropriação

Pronto, a partir daí, provavelmente meados dos anos 70, virou moda passar reveillon na praia. Milhões de pessoas se reuniam para ver a queima de fogos, a cascata do Meridien (na esquina da Princesa Isabel com Atlântica) e a prefeitura encampou a festa.

Nada obstante, os praticantes de religiões de matriz africana ainda se reuniam em pequenos grupos ao longo da praia. Eu fui pela primeira vez em 2004. Alugamos um apartamento eu, meu companheiro à época e um amigo dele, em cima da finada Le Boy. Eu não tinha muita maturidade e bebi demais. Acabei vendo só a virada e eles me levaram para o apartamento. Fiquei puto, mas aceitei.

Anos mais tarde, a prefeitura entrou em acordo com os representantes do Mercadão de Madureira e a famosa Festa de Yemanjá passou a ser celebrada no dia 28/12, para não atrapalhar a burguesada. Hoje o comércio, os hotéis e os serviços turísticos lucram milhões de reais com a tradição iniciada por um zelador de terreiro. Estes foram banidos de sua festa.

Então, quando alguém diz que turbante é apropriação cultural, pense melhor. Apropriação é isso: pegar a cultura alheia, apagar os criadores, embranquecer e lucrar tremendamente.

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