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TEATRO

Medeia – a releitura do clássico de Eurípedes

A tragédia de Medeia, escrita por Eurípedes há mais de dois mil anos, continua atual, porque trata de relações amorosas profundas e perturbadoras.

No clássico, Jasão quando retorna de Cólquida, com os argonautas, se apaixona pela princesa Medeia e a traz consigo a Corinto. Medeia era sacerdotisa de Apolo e uma mulher muito poderosa, mas estrangeira na terra do marido. Por isso, rejeitada. O tempo passa, eles têm filhos e Jasão perde o interesse pela mulher, apaixonando-se por Glauce, filha de Creonte, o rei de Corinto.

A peça Medeia foi escrita por Eurípedes em 431 a.C

Centrada no desejo de vingança da mulher traída contra o marido infiel, o texto de Eurípedes trata das relações de poder, pois Jasão vai se casar com outra princesa, mais jovem. Por isso, Medeia planeja uma vingança no melhor estilo das tragédias gregas, causando a morte de todos no final e o sofrimento para quem sobrevive.

Gota d’Água – uma adaptação brasileira

Chico Buarque e Paulo Pontes escreveram uma adaptação magistral da peça, colocando Joana no papel da mulher traída, Jasão e Creonte mantiveram seus nomes. A peça, escrita em 1975, estreou no mesmo ano, com Bibi Ferreira no papel de Joana e foi um enorme sucesso de público e crítica. O Brasil vivia os piores anos da ditadura civil-militar que se abateu sobre o País como uma praga faraônica e, por isso, vários cortes tiveram de ser feitos no texto original.

Não obstante, a peça traz críticas à pressão habitacional dos centros urbanos, à opressão dos mais ricos sobre os mais pobres, isso tudo com o pano de fundo do amor desesperado de Joana por Jasão. Abandonada por ele, a tragédia brasileira obedece à regra de se passar no período de um dia. Começa na véspera do casamento de Jasão e termina logo após a cerimônia.

As canções, como não poderia deixar de ser, são incríveis. Fazem parte do texto a canção título “Gota d’água”, samba gravado por Jasão e sucesso que o tirou da pobreza e o levou às altas rodas; A Flor da Idade, Meu Bem Querer e Basta um Dia, são páginas do cancioneiro popular que sobrevivem sem a peça.

Eu tive a oportunidade de ver, no começo dos anos 2000, a montagem de Isabela Bicalho, cuja interpretação de Joana foi surpreendente, Thelmo Fernandes, no papel do opressor Creonte e disponível na íntegra no Youtube:

Medea da Cia do Sopro atualiza a tragédia de forma magistral

A montagem da Cia do Sopro, com Fani Feldman no papel título, nos convida a penetrar na intimidade. A cenografia é impecável e convivemos no dia da tragédia, de perto, com a dor da mulher abandonada. Juliana Sanches e Maristela Chelala, que fazem as amigas de Medea, mas que não se conheciam antes, dão a introdução na antessala, e depois que entramos na sala desarrumada, somos confrontados com a realidade dessa mulher sofrida e amargurada.

No entanto, ela não se submete e mesmo dolorida e compungida, resolve enfrenta Carter, o pai de Kate, a noiva de Jasão e dono da casa onde Medea e ele viveram. Não sei se Mike Bartlett leu Gota d’Água, mas é nítida a homenagem deste espetáculo a Chico e Pontes. Enfim: Medea enfrenta Jasão, Carter e ainda afronta as falsas amigas. É um texto profundamente feminista contemporâneo, sem perder a linha dramática de Eurípedes, mas com muita atenção para as questões atuais.

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