Depois dos resultados das eleições deste domingo eu fiquei abatidíssimo. Nada de pior poderia ter acontecido, do que Damares ser eleita para o Senado pelo DF.
Dahmer é uma série da Netflix
Passei o domingo à tarde e a segunda de manhã maratonando Dahmer, Um Canibal Americano na Netflix. O seriado é muito impressionante e me lembrou a minha primeira tentativa de produzir textos dramáticos. Eu tinha me mudado para o Rio de Janeiro e aproveitei para fazer um curso de dramaturgia na Cia de Teatro Contemporâneo (https://ciadeteatrocontemporaneo.com.br), na Conde de Irajá, em Botafogo. Lá, conheci duas grandes referências para minha vida artística: o roteirista Celso Taddei e a falecida Claudia Martelotta.
O objetivo da oficina, que durou cerca de três meses, com uma aula por semana, era a produção de um “quart d’heure“, embora à época eu nem imaginasse que isso era um estilo de produção teatral do princípio do Séc. XX na Europa nórdica e na França. Eu recém houvera lido uma notícia de jornal sobre a moça que se casou com o maníaco do parque e desenvolvi uma pequena peça sobre o tema.
A cultura da perversão
E eu me lembrei disso porque quase tudo o que ouvi do seriado foi que ele acabou por glamourizar um sujeito perverso. Foi muito estranho para mim, porque, durante todo o tempo que passei assistindo aos capítulos, sentia uma certa aversão por tudo o que estava acontecendo. Acabei me identificando mais com a personagem da vizinha, Glenda, em sua cruzada para tentar denunciar alguém de quem suspeitava.
Morando num bairro onde a maioria dos habitantes era não branca, Jeffrey Dahmer era uma exceção. No seriado, parece que ele só foi parar ali porque não conseguia emprego melhor remunerado e tinha de viver em uma vizinhança mais barata, mas essa pode ter sido só a desculpa. Fico imaginando se, na vida real, ele não teria ido para lá porque, branco, teria muito mais liberdade de agir. O bom exemplo é quando a vizinha Glenda insiste que uma de suas vítimas é uma criança, numa abordagem policial, e a dupla de guardas simplesmente ignora os apelos da vizinhança (mais de uma pessoa), dando razão apenas a Dahmer. Certamente essa circunstância facilitava a atuação do canibal.
Os roteiristas da série talvez tenham pensado nisso ao descrever a conduta policial como muito negligente, não dá pra saber, mas indica um sentimento que vem perpassando nosso imaginário, da mudança de postura da indústria com relação à conduta policial estadunidense, repetida no ocidente e no Brasil, de um profundo preconceito racial. A palavra das pessoas negras não vale contra pessoas brancas.
A praga do Capitalismo
A série tem excelentes interpretações, vibrante e angustiante, como deve ser essa narrativa. Eu não encarei como uma glamourização da psicopatia, mas isso estar aparecendo desta forma é um sintoma sério da doença da sociedade capitalista.
Aqui no Brasil, tivemos a eleição dessa senhora execrável como senadora pelo Distrito Federal. Mentirosa contumaz, é aliada de primeira hora do excremento sentado à cadeira do planalto, mas, na minha opinião, é mil vezes mais perigosa. O sujeito inominável vitupera, xinga, agride frontalmente. É de outra natureza a abjeção que provoca. esta senhora, eleita para ficar oito anos como representante da unidade federativa onde se situa a capital do País, tem um sorrisinho, um jeitinho de falar que seduz quem a ouve. E isso é o que mais me assusta, porque nesse jeitinho, vai conquistando as pessoas, obnubilando o raciocínio.
Mas ela mente! Mente muito! Mente sempre! Quase tudo que aquela boca profere é uma ofensa grave aos fatos e à verdade. Não obstante, por falar macio e sorrir, conquistou mentes e corações. E esse é o maior perigo a ser enfrentado.
Enquanto Dahmer matou a granel, no varejo, essa senhora vai matar no atacado. Com essa pauta moral, é muito provável que obtenha aval para extinguir um dos maiores programas de combate ao HIV/Aids do planeta. E se isso ocorrer, conviveremos com índices de mortalidade pelo vírus iguais aos das décadas de 80 e 90, além das cenas dantescas do morticínio.
A série me afastou um pouco do sentimento de derrota, mas me deixou ainda um gosto de derrota inexorável. Espero estar errado, mas sinto que não estou. O futuro se mostra cada dia mais distópico.